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Lideranças do agro avaliam efeito Trump sobre o setor
por Revista Globo Rural:
POR RAPHAEL SALOMÃO E VALDIR RIBEIRO JR.*
Abag teme protecionismo e consultores descartam, pelo menos por enquanto, reflexo negativo dos EUA sobre os negócios
Um eventual aumento do protecionismo está entre as preocupações de especialistas e lideranças do agronegócio em relação ao governo de Donald Trump nos Estados Unidos. Durante a campanha, o discurso do então candidato sinalizou uma economia mais fechada e restrições a alguns países, como a China.
É fato que, neste momento, logo depois da eleição, qualquer conjectura não passa de mera especulação, apenas baseada em diversas declarações de campanha do republicano. Mas, ainda assim, com ele eleito, há quem já enxergue motivos para temer efeitos negativos sobre a relação bilateral no comércio agropecuário.
“Precisamos esperar um pouco mais para ver, mas é um temor. O governo brasileiro tem que ficar de sobreaviso. Vamos nos adiantar e nos preparar para isso”, alerta o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Luiz Carlos Corrêa Carvalho.
Ele avalia que um aumento do protecionismo no governo Trump poderia refletir de duas formas: diretamente na entrada de produtos brasileiros nos Estados Unidos e em eventuais medidas protecionistas adotadas por outros países sobre os quais o posicionamento norte-americano tenha alguma influência.
Oficialmente, o governo brasileiro diz não acreditar em mudança nas relações com os norte-americanos depois da posse de Donald Trump, em 20 de janeiro do ano que vem. O presidente Michel Temer, disse acreditar que há relações institucionais e afirmou que os Estados Unidos são prioridade para o Brasil
Mas no primeiro escalão do Planalto, há quem seja mais cauteloso. Nesta quarta-feira (9/11), o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, reconheceu a possibilidade de efeitos negativos do governo Trump para o agronegócio brasileiro. Não tanto em relação ao acesso de produtos, mas à participação nos mercados onde os dois países são competidores.
“Eles são muitos fortes em áreas que somos competidores mundo afora. E se esse protecionismo vier em forma de novos subsídios para a agricultura norte-americana, aí nós teremos problemas”, afirmou, de acordo com o jornal O Estado de S. Paulo.
O professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Carlos Eduardo Daltro, considera essa possibilidade. A política de subsídios à produção agrícola norte-americana é definida na Farm Bill, a lei plurianual periodicamente revisada. A próxima revisão deve ser em 2018 e pode trazer medidas protecionistas ao setor rural.
Daltro lembra que Trump recebeu apoio significativo na região central dos Estados Unidos, com forte produção agrícola. “O etanol também pode ser afetado, pois não dá para saber se ele vai continuar a incentivar a indústria americana de milho para o biocombustível. E recentemente o Brasil fechou acordos de exportação de carne que poderiam ser prejudicados”, afirma.
Fato comemorado pelo governo e pela indústria nacional, a exportação de carne bovina in natura para os Estados Unidos já começou. Procurada pela reportagem, a Abiec, associação que reúne frigoríficos exportadores, informou, pela assessoria, que não comentaria o assunto.
Parceria comercial
Os Estados Unidos são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás da China. No ano passado, foram movimentados US$ 50,5 bilhões, sendo US$ 24,09 bilhões só de exportações brasileiras, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).
As exportações das empresas do agronegócio brasileiro para os Estados Unidos somaram US$ 6,467 bilhões no ano passado, enquanto as importações totalizaram US$ 1,255 bilhão.
O mercado norte-americano é o principal destino do café brasileiro. De acordo com o Conselho dos Exportadores e Café do Brasil (CeCafé), o volume embarcado somou 5,27 milhões de sacas de 60 quilos de janeiro a outubro deste ano. A participação no todo foi de 19,1% nos primeiro dez meses do ano.
No suco de laranja, Brasil e Estados Unidos são concorrentes em alguns mercados, mas complementares no atendimento à própria demanda norte-americana. De janeiro a outubro, as exportações do produto brasileiro para os Estados Unidos somou US$ 175,84 milhões, informa o MDIC.
Representantes do setor não acreditam, no entanto, que o governo Trump possa trazer prejuízos. Primeiro porque processadoras brasileiras também estão nos Estados Unidos. Depois porque o suco nacional já é taxado ao entrar no mercado norte-americano.
Além disso, nos últimos anos, a produção local vem caindo, tornando o país mais dependente do produto de fora. O sócio da consultoria Agriplanning, Maurício Mendes, lembra que em 2004, a Flórida, que concentra a produção de laranja nos Estados Unidos, colheu 242 milhões de caixas. Neste ano, deve colher 70 milhões.
“Qualquer medida mais restritiva não teria sentido. Não vejo reflexos negativos no curto nem no médio prazo”, diz ele, que também pertence ao Grupo de Consultores em Citrus (GConci).
Para a indústria brasileira de carne de frango, a ascensão de Trump pode significar futuramente uma concorrência maior na Rússia, pela proximidade dele com o presidente Vladimir Putin. De outro lado, pode representar maior acesso do produto brasileiro a mercados como o México.
“Na avicultura, os EUA são os maiores produtores, e nós os maiores exportadores do mundo. Nossa relação é de parceria com o setor norte-americano. Nossos mercados não estão abertos um para o outro, mas convivemos numa harmonia positiva e irrepreensível no mercado mundial”, diz o presidente executivo da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra.
Já sócio diretor da Archer Consulting, Arnaldo Corrêa, até consegue ver um ponto que pode ser positivo para o agronegócio brasileiro nas ideias de Trump em relação à economia global: a oposição do presidente eleito dos Estados Unidos a acordos comerciais, como o Tratado Transpacífico (TPP).
“A coisa não deve mudar com tanta velocidade. Se ele acabar com acordos, os Estados Unidos vão ficar mais restritos. Mas no TPP, que o Brasil não participa, pode até ser positivo porque fecha espaço de concorrentes”, avalia, ponderando, no entanto, que ainda é muito cedo para traçar expectativas.
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