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Um ano difícil para a indústria de café

por Valor via Portal KLFF:
Após enfrentar dificuldades de abastecimento neste semestre em decorrência, sobretudo, da quebra da safra de café conilon no Espírito Santo no ciclo 2016/17, as indústrias de café do país preveem mais um ano turbulento em 2017, com mais disputa por matéria-prima. A principal razão é que a colheita capixaba de conilon deve recuar mais uma vez na safra 2017/18, segundo especialistas, já que neste ano a escassez de chuvas afetou o desenvolvimento dos cafeeiros no Estado e, consequentemente, seu potencial de produção.

A falta de oferta neste ano – que fez os preços do conilon baterem recorde – levou as empresas torrefadoras e as de café solúvel a solicitarem ao governo a importação de café robusta para utilizar em seus blends com arábica. O ministro da Agricultura Blairo Maggi chegou a recomendar, este mês, à Câmara de Comércio Exterior (Camex) a aprovação da importação, mas, pressionado por entidades de cafeicultores, suspendeu temporariamente o pedido para análise.

As entidades de produtores, como Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e Conselho Nacional do Café (CNC), alegam que há estoques no país e que a importação poderia derrubar os preços do café conilon no mercado doméstico. Avaliam ainda que a importação traz riscos fitossanitários para o produto brasileiro.

Para as indústrias, porém, só a importação traria algum alívio. E o impasse em torno da autorização para que ela ocorra só aumenta a preocupação das entidades que reúnem as empresas.

Aguinaldo José de Lima, diretor de relações institucionais da Associação Brasileira da Indústria de Café Solúvel (Abics), avalia que a suspensão da decisão sobre a importação é uma “parada técnica”, mas diz que o ” jogo continua”. A indústria de solúvel tem no conilon sua principal matéria-prima – com demanda de 350 mil sacas mensais – no país.

O temor é que a escassez de oferta que eleva preços afete as exportações do setor, uma vez que o produto pode ficar menos competitivo. “Se não houver importação [de matéria-prima], o cenário será dramático, nem quero fazer previsões”, afirma Lima. Atualmente, as vendas externas de café solúvel chegam ao equivalente a 3,6 milhoes de sacas, mas esse número pode cair, reconhece.

Ele explica que o se preço doméstico ficar acima do internacional, o produto brasileiro fica menos competitivo em relação a outros exportadores de solúvel, como o Vietnã, e o Brasil pode perder participação de mercado.

A oferta minguada já afeta os contratos de venda de solúvel ao exterior. Normalmente, eles são feitos por períodos de seis meses a até um ano, com entregas mensais. Mas, agora, os exportadores estão trabalhando com prazos mais curtos, dois a três meses, para não perder clientes, segundo a indústria.

O Brasil é o maior exportador mundial de café solúvel mas vem perdendo espaço no mercado para concorrentes como o Vietnã, que tem ampliado as vendas. Enquanto os volumes exportados pelo Brasil têm crescido 1% ao ano, alcançando 80.113 toneladas em 2015, os do Vietnã subiram 86,2% ao ano desde 2010 e somaram 20.862 toneladas ano passado.

Nathan Herszkowicz, diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), também prevê uma situação “desconfortável” para o suprimento em 2017. Para ele, a eventual importação “não resolve, mas alivia um pouco”. A indústria torrefadora usa conilon nos blends com arábica, mas teve de reduzir o consumo diante da menor oferta. Normalmente, o conilon era usado numa proporção de 50% para 50% de arábica. Mas o uso de conilon ficou abaixo de 20% para grande parte das empresas e algumas até deixaram de usar o conilon no blend. O consumo no segmento é estimado em 800 mil sacas por mês.

Nesse cenário, os custos da indústria cresceram, mas elas têm tido dificuldade ou não conseguido repassar a alta. A razão, segundo Herszkowicz, é que há uma retração por parte do consumidor em decorrência da crise. A situação é preocupante porque “o consumo pode, eventualmente, diminuir num cenário de suprimento irregular e até crítico”, diz. Segundo ele, as empresas já relatam uma migração por parte dos consumidores de categorias mais caras para mais baratas de produtos.

O dirigente prevê que no pico da entressafra, no primeiro trimestre de 2017, deve haver escassez, alta de preço e dificuldade de repasse. O conilon da nova safra só estará disponível em maio, pois a colheita começa em abril, observa.

A indústria defende a importação de café robusta, por um tempo limitado e com volumes controlados, para atender esse período de entressafra. Como há divergência em relação ao número de estoques brasileiros de conilon, a proposta só será avaliada, agora, na próxima da reunião da Camex, no dia 15 de janeiro.

Até lá, a Conab fará um levantamento dos estoques privados de conilon no país. Com esse número em mãos, o ministério ira decidir se recomenda a importação. Um levantamento realizado pelo deputado Evair de Melo (PV-ES), a partir de visitas a mais de 20 armazéns, cooperativas, indústrias e exportadores do Espírito Santo, estima que o estoque está em torno de 4,5 milhões a 5,5 milhões de sacas, mas o Ministério da Agricultura trabalhava com um estoque entre 2 milhões e 2,5 milhões de sacas.

Produção deve cair de novo no ES
O bom volume de chuvas que tem atingido o Espírito Santo recentemente só vai favorecer a safra 2018/19 de café conilon do Estado. A produção da próxima temporada, a 2017/18, que começa a ser colhida entre o fim de março e abril do ano que vem ainda deve mostrar os reflexos dos quase três anos de seca e forte calor no Estado, que é o maior produtor da espécie no Brasil.

Romário Ferrão, coordenador do Programa Cafeicultura do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), diz que a colheita de 2017/18 será definida por quanto a planta se desenvolveu neste ano. Como houve escassez de chuvas em 2015 e na maior parte de 2016 no Espírito Santo, as plantas se desenvolveram pouco, o que significa uma menor área para a formação de flores que se transformarão em frutos.

Segundo ele, só será possível “ter noção da safra a partir de janeiro”. Mas, o que é quase certo, é que a próxima colheita não será “cheia”, acrescenta. “Se tudo correr bem, será parecida com a de 2016/17 ou menor até”, admite.

A colheita da espécie conilon na safra 2016/17 no Brasil somou 7,99 milhões de sacas, queda 28,6% ante o ciclo anterior, segundo a Conab. No Espírito Santo, a produção caiu 35,1%, para 5,035 milhões de sacas.

Marco Antonio dos Santos, agrometeorologista da Rural Clima, concorda que a próxima colheita no Espírito Santo ainda deve ser “muito baixa”, após uma florada “ruim” este ano. Mas o clima atual deve garantir uma produção mais favorável na safra seguinte. Isso porque as chuvas têm favorecido o desenvolvimento vegetativo das plantas, o que deve permitir uma boa florada dos cafezais capixabas em 2017.

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